A questão da trilha de áudio com os discursos de ódio sobrepondo a fala da ativista foi uma questão nos últimos dias. Como eu havia pensando, a ideia é que a mescla desses áudios com um background sonoro criasse uma espécie de fundo emocional que pulsa devagar. Aos poucos, ela vai ganhando corpo, intensidade, textura. Mas o que realmente desloca quem assiste são os discursos de ódio que se infiltram nesse crescendo. São discursos reais, mensagens direcionadas a imigrantes, corpos racializados, pessoas como os ativistas recortados. O discurso em si já é um exagero. E é justamente isso que incomoda: elas são reais demais, cotidianas demais.
Durante os testes, percebi que esse aspecto causava reações fortes. Algumas pessoas relataram desconforto auditivo, outras mencionaram sentir-se invadidas pela agressividade do conteúdo. E isso, pra mim, foi um sinal de que o áudio estava cumprindo sua função, estava funcionando. O objetivo nunca foi criar uma trilha “bonita” ou “agradável”. Ao contrário, o som aqui é uma ferida aberta, um lembrete do ruído constante que atravessa os corpos daqueles que estão sempre sendo questionados, vigiados, atacados.
Então, a decisão de usar esse áudio "incomodo" como ferramenta de tensão foi intencional. Eu queria criar uma espécie de ambiente sonoro que colapsa, que aperta, que simula o peso de existir sob pressão constante. É desconfortável porque precisa ser. O ruído que cresce é o eco de um sistema que não cala. E ao fazer isso subir, saturar o espaço, eu convido o espectador a sentir, mesmo que por alguns minutos, a violência simbólica que essas mensagens carregam. No fim, é justamente nesse atrito que a obra ganha força.
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